2018-02-16

E agora BE-Madeira?

O Bloco não soube ou não quis aproveitar os bons resultados de 2015 para reforçar a sua atuação a favor de quem trabalha - que é a sua missão. Fechou-se numa lógica da preservação do poder interno, como se fossem demasiados votos para a camioneta.

A transição da liderança de Paulo Martins, em 2008, deu-se num contexto de guerrilha contra a sua família, acusada de monopolizar o BE. Os novos dirigentes quiseram afastar a “velha guarda” da UDP, tida como um obstáculo. A estratégia levada até às regionais de 2011, resultou no desastre eleitoral, o pior resultado de sempre. Fora do parlamento, veio um tempo difícil com sacrifícios de muitos, mas não de quem foi pago para se dedicar ao partido a tempo inteiro.

Em 2015 a estratégia foi a oposta, aberta a contributos de todos os militantes, com vários porta-vozes. O coletivo funcionou e deu bom resultado, um grupo parlamentar e deu ânimo ao partido que registava desaires desde 2009.

Nas legislativas o BE foi terceiro, elegeu um deputado da República e quase triplicou a votação das regionais. O BE teve na campanha um rosto e um porta-voz, que não foi o do coordenador regional - cujo maior contributo terá sido mesmo a discrição. A mudança desta vez funcionou, deu o melhor resultado de sempre.

Um partido é um coletivo de gente unida em torno de uma missão e em cada momento indica um rosto que o representa. Esse rosto tem de ser credível e inspirar confiança ou não merecerá o voto do povo. Há que respeitar o coletivo e não usá-lo só para diluir responsabilidades e para ratificar decisões consumadas. Há a responsabilidade coletiva, que não apaga a individual.

Com estes bons resultados, o partido deveria ter feito mais: criar núcleos locais, maior presença junto das pessoas, cativar novos militantes, quadros qualificados que são a marca do BE, reforçar a sua credibilidade, mostrar mais caras nas iniciativas políticas e no parlamento com a rotatividade, exigir maior representação na coligação no Funchal. Assim se constrói um coletivo forte. Quem não deixou acontecer, para proteger o seu lugar, não é credível para o fazer agora.

Um rumo claro. A dívida, o desemprego, a pobreza ou a falta dum hospital na Madeira, resultam do mau governo, das más opções, das obras inúteis, da corrupção. Os responsáveis estão na Região, não em Lisboa. Um poder que diz defender a Madeira, mas na verdade defende os parasitas, os senhorios. Combater este mau governo significa desmontar as teses de que a esquerda não é autonomista, mostrar uma prática política de abertura, transparência, sem tiques da prepotência, sem eternizar-se nos lugares, nem fantasias de inimigos externos que são só truques para branquear as responsabilidades de quem governa há 40 anos.

Um coletivo forte, um rosto credível e um rumo claro, tudo o que é preciso, está ao nosso alcance, haja vontade!

A escolha é simples para os bloquistas da Madeira: continuar na via que já conduziu ao desastre; ou seguir um caminho diferente que já se revelou capaz de conquistas antes impensáveis.


(publicado em dnoticias.pt em 13/02/2018)

2018-02-15

As sondagens e o BE-Madeira

A evolução das indicações de voto conforme as sondagens publicadas na Madeira, confirmam a leitura desta candidatura, de que o Bloco de Esquerda entrou numa espécie de estado dormente desde 2015. As declarações de satisfação pelos resultados da última sondagem (4,9%), revelam um auto comprazimento por o partido ter regressado à sua zona de conforto, depois de um resultado que não era esperado (nem desejado, porventura) e para o qual a direção política não estava preparada.

Desde as eleições de 2015 foram publicadas quatro sondagens pelo DN-Madeira, ilustradas no gráfico seguinte. A evolução é descendente, ao longo de 2017 desceu de 6,9 para 4,1 e a ultima mostra a tímida recuperação, que cabe dentro da margem de erro.



Perante uma projeção que aponta para a manutenção de dois deputados, considerar que o BE será imprescindível para uma nova maioria, é excessivo.
Ficar contente com 4,9% nas sondagens quando o Bloco chegou perto dos 11% é falta de ambição.
Ou será que é este o objetivo do atual coordenador, manter o partido num patamar à volta dos 4%, com um ou dois deputados? Eternizar-se à frente dum BE/M pequeno e fechado, com poucos militantes e sem quadros qualificados, um partido de protesto, com atividade política em regime de serviços mínimos e sem grande consistência?

Se não é esse o objetivo, não faz sentido a satisfação com a evolução negativa que as sondagens mostram. Na noite eleitoral das legislativas, entre a alegria e a surpresa pela eleição de um deputado à Assembleia da República, uma exclamação ficou-me na memória "não vamos pensar que isto agora vai ser sempre assim". Manifestação de prudência ou expressão de um desejo?

O Bloco de Esquerda pode fazer muito mais na Madeira, mas tem de organizar-se melhor, planear o trabalho definir prioridades e objetivos a atingir. Deve abrir-se a novos militantes, mas sem desconsiderar os mais antigos, cativar quadros qualificados.

Os madeirenses votam no BE em eleições de âmbito nacional, em maior número que em eleições de âmbito regional. Em 2015 o resultado no círculo da Madeira foi até superior ao resultado nacional.
Não há um problema dos madeirenses com o Bloco de Esquerda, há um problema com a sua organização regional, com os seus protagonistas e com o seu discurso. Há que mudar isso!

2018-02-14

Mistificações



Mito 1: O Bloco está a crescer na Madeira 

Segundo este argumento o BE está a crescer na Madeira e como em equipa que ganha não se mexe, não se justifica haver mudanças na sua direção regional. 

O Bloco concorre às eleições regionais desde 2004 quando teve o seu melhor resultado de sempre. Se traçarmos uma linha de tendência, ela é descendente, não voltou a atingir o resultado de 2004. Cresce em relação às eleições anteriores, de 2011, mas essas foram um desastre. A tese de que o BE está a crescer na Madeira tem pouca consistência.


Mito 2: A eleição de um deputado à Assembleia da República pelo BE na Madeira, deve-se ao "efeito Catarina"
Esta tese desvaloriza eventuais efeitos locais no resultado surpreendente obtido pelo BE em Outubro de 2015. Acontece que a evolução dos resultados nas três ultimas eleições legislativas é muito diferente na Madeira e no total do país.
A nível nacional, em 2015 o BE com a Catarina Martins conseguiu um resultado ao nível de 2009, ligeiramente abaixo.



Mas na Madeira o resultado de 2015 foi muito superior ao de 2009, um aumento do numero de votos de quase 60%. Houve um "efeito Catarina" por todo o país, visível face ao resultado das eleições anteriores (quase duplicou) e face às sondagens de alguns meses antes das eleições.


Esse efeito, em linha com o que se passou no resto do país, daria cerca de 8.440 votos na Madeira - o resultado de 2009. Não faz sentido é considerar que o "efeito Catarina" teve especial incidência na Madeira, ela foi cabeça de lista no Porto.
O crescimento excepcional da votação no BE na Madeira explica-se também por fatores locais. E se a um desconhecido não se pode imputar tamanho impacto, então a explicação residirá noutro fator, esse sim conhecido, mas que tem o efeito de afastar os votantes do BE e que desta vez não esteve presente, ou a sua presença foi menos notada.


É um facto que em eleições legislativas anteriores o resultado alcançado no círculo eleitoral da Madeira pelo Bloco ficou aquém do resultado a nível nacional. Mas em 2015 não foi assim, pela primeira vez o resultado na Madeira ficou até ligeiramente acima do resultado nacional. Estes dados são compatíveis com a hipótese do factor negativo que afasta eleitores e que em 2015 não esteve presente.
A boa imagem dos dirigentes nacionais do BE em anos anteriores não foi suficiente para que a votação na Madeira se aproximasse do resultado nacional.


Em eleições regionais a influência das figuras nacionais do partido pesa menos, os dados mostram isso, a votação nas regionais tem sido mais fraca que a das legislativas nacionais no círculo Madeira.



Enquanto nas eleições legislativas o BE na Madeira já ultrapassou os 13.000 votos, nas regionais não passa dos 5.000, mostra-se estagnado. Estes dados também reforçam a hipótese do fator negativo a nível regional, que faz perder votos. Há muitos madeirenses que votam no BE em eleições de âmbito nacional, cativados pelo discurso e pela imagem das figuras nacionais, mas que não votam no Bloco em eleições regionais, porque as figuras e o discurso já não os cativam.

Os resultados de 2015 e as várias análises aqui apresentadas o que sugerem é que uma mudança de protagonistas e de discurso pode bem ser a necessário para o Bloco na Madeira passar a ter um desempenho eleitoral ao nível do que tem registado a nível nacional. O resultado de outubro de 2015 mostra que é possível.

Se a política não é uma ciência exacta, também não é uma ciência oculta. Os resultados passados não são garantia de igual desempenho no futuro, mas os resultados não caem do céu, não se explicam pelos astros.

Ou se admite que há um impacto dos principais rostos das campanhas eleitorais e assim faz sentido falar em "efeito Catarina" e em outros efeitos locais. Ou se as personalidades não têm impacto e tem tudo a ver com o coletivo, significa que é indiferente que pessoas são candidatos aos cargos.

O que não é coerente é admitir um "efeito Catarina" a nível nacional e a nível regional explicar tudo pelo coletivo. Haja paciência.