O offshore da Madeira não é melhor nem pior que outros que funcionam na Europa ao abrigo da hipocrisia dos governos.
Ao contrário da propaganda oficial, o CINM [Centro Internacional de Negócios da Madeira] não serve para captar investimento nem para criar emprego (ou serve apenas muito marginalmente) e também não serve para diversificar a economia regional, isto é, para trazer novas atividades económicas para a Madeira. Serve para fugir aos impostos, para esconder no anonimato os verdadeiros donos de algumas grandes fortunas e para encobrir negócios pouco claros.
Mas dá dinheiro, é verdade, quase 200 milhões em IRC para os cofres da região em 2016. Mas então tudo o que dá dinheiro é bom, é aceitável? Os negócios da droga, o tráfico de armas para grupos terroristas, o tráfico de seres humanos - de crianças - para exploração sexual ou para outras variantes de trabalho escravo, também envolvem muitos milhões, vamos aceitar os proveitos de tais negócios?
O CINM também faz perder muitos milhões à Madeira, desde que foi criado. Os negócios que ali são registados no papel, de muitos milhões, influenciam o PIB. Nas estatísticas parece que somos ricos com um PIB 5% acima da média da Europa e 25% acima da média do país, em 2009. A consequência é perder largos milhões em fundos comunitários e em transferências do Orçamento do Estado para a região e para os municípios.
O grande objetivo para a criação do regime fiscal favorável do CINM, o fundamento para a sua aprovação pela Europa, foi e é a diversificação da economia regional e combater a histórica dependência do turismo e das obras públicas, criar mais riqueza, mais empregos e de melhor qualidade. Em suma, uma maior autonomia económica e financeira à Madeira.
O CINM fracassou! Passaram 30 anos e a dependência face ao turismo não diminuiu, nem surgiram novos setores de atividade na região. A criação de empregos é residual e os números anunciados são uma ficção. Uma única pessoa ocupa o cargo de gerente em 323 empresas - são 323 empregos para as estatísticas. Outras 12 pessoas ocupam mais de 100 postos de trabalho cada uma - para cima de 1.200 empregos para as estatísticas… e assim chega-se às contas oficiais de 7.000, outra vezes 9.000 empregos.
Mas a criação de emprego nem é levada a sério: o Bloco de Esquerda propôs em 2016, um novo regime que aumentava a exigência de criação de empregos. A cada empresa que se instalasse de futuro seria exigido a criação de seis postos de trabalho em vez de apenas um, a tempo inteiro e com vínculo permanente. A proposta foi chumbada pelo PS, PSD e CDS, com o argumento que iria matar o CINM. Não é honesto o argumento, as novas regras seriam aplicadas apenas às novas empresas, quem já estava continuaria a beneficiar das mesmas regras que estão em vigor. Não passa de uma farsa a conversa do emprego o que pretendem as autoridades regionais é uma praça aberta a toda e qualquer traficância.
O Grupo Pestana tem beneficiado como principal acionista da SDM, que gere o CINM. Só em taxas a SDM cobra um mínimo 1.800 € por ano a cada empresa, as 2.000 empresas registadas proporcionam receitas superiores a 5 milhões por ano, o que ajuda a compreender a dimensão que este grupo hoteleiro alcançou nos últimos anos.
Falta visão estratégica
A realidade do CINM é muito frágil, qual castelo de cartas. As empresas cuja presença se limita a um endereço postal e a um funcionário partilhado, a esmagadora maioria, podem contribuir com muitos milhões em IRC, mas não dão garantia alguma de permanência. Nada as prende cá, podem sair da Madeira em menos de um instante. Uma alteração política europeia, um “tweet” de Donald Trump ou outro evento fortuito que escapa ao nosso controlo, pode determinar uma debandada. E nesse caso o que sobrará será nada, um deserto. E isto é trágico!
Os benefícios fiscais do CINM deveriam ser aproveitados para criar emprego efetivo, empresas que ganhem raízes na Madeira e não desapareçam à mínima “brisa” desfavorável, que ofereçam perspetivas de permanência a médio e longo prazo. O Bloco deu o seu contributo, como a alteração ao regime acima referida, não se tratava de matar o CINM, mas de ser mais exigente de pensar no futuro e não apenas no imediato.
Faltou a continua a faltar visão estratégica para que o CINM possa cumprir a promessa de tornar-se um instrumento de desenvolvimento regional. Prevalecem os interesses particulares e imediatistas sobre o interesse geral e a visão de futuro.
(publicado em Esquerda.net a 22/02/2017)
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