2016-06-21

Inovar e empreender é criar riqueza e não ricos

O modelo associativo e cooperativo também responde à inovação e deve ser apoiado numa estratégia de crescimento.


O programa “Start-Up Portugal” surge como um pilar central da política do Governo. Declaro que nesta bancada nada temos contra a inovação, tecnológica de processos ou modelos de organização. Este programa está orientado para o modelo da empresa lucrativa ou capitalista, como se não existisse outros modelos de organização das atividades económicas.

Existe o modelo cooperativo ou associativo. Para dar um exemplo, maior grupo económico do País Basco espanhol, Corporacion Mondragon, detentora da marca Fagor, é um conglomerado de cooperativas, nascido em 1956, emprega 74.000 trabalhadores e tem volume de negócios acima dos 3 mil milhões de Euros. Nos seus 60 anos de historia ainda não produziu qualquer milionário, mas produz muita riqueza.

O modelo associativo e cooperativo também responde à inovação e deve ser incentivado numa estratégia de crescimento. Responde até melhor no longo prazo pois vários estudos mostram que é um modelo mais resiliente as crises, perene, fortemente ancorado no território não se deslocaliza, cria empregos duradouros e de maior qualidade que o modelo lucrativo ou especulativo de empresa.

A sua governação é democrática, porque a empresa deve ser excluída do âmbito da aplicação da democracia e continuar no absolutismo – a empresa sou eu. A empresa não é só o empresário é também o conjunto dos seus trabalhadores e dos membros da comunidade onde se insere e que dela depende. Porque devem ser estes atores excluídos de participar na governação da empresa? Quem nesta casa [Assembleia da República] não defende a Democracia?

Qual o conceito de empreendedor que enforma o programa? Um mais amplo de criatividade e inconformismo onde cabem todos criadores, artistas, investigadores e não apenas os empresários, ou o mais estreito que considera apenas quem acima de tudo quer ganhar dinheiro?

Nem todas as pessoas se movem pela ganância, pela ambição de serem ricas ou patrões, não será o caso provavelmente para a maioria das pessoas. Mas isso não faz delas menos criativas ou menos inovadoras, menos empenhadas numa vida melhor para si próprias e para as suas comunidades.

O programa Simplex revelou isso mesmo, a maior parte das medidas resultam de contributos de funcionários públicos, pessoas que segundo aquela visão mais estreita de empreender, nem teriam capacidade criativa.

Os modelos alternativos para as pessoas organizarem as atividades económicas e contribuírem para o crescimento devem igualmente ser elegíveis para os programas de incentivo à criação de empresas. É necessário simplificar e desburocratizar a criação e a vida das associações e das cooperativas e deixar de as remeter para os setores de atividade restritos, como os conexos com as funções sociais do Estado.

É necessário considerar instrumentos de apoio aos trabalhadores de unidades fabris sob ameaça de deslocalização, para que estes possam dar continuidade à atividade em autogestão, salvaguardando os empregos e as competências que acumularam. A democracia é ela própria uma forma de autogestão e se é válida para o governo dos estados também é válida para o governo das empresas.

A liberalização dos mercados tem conduzido a uma concentração crescente e surgem gigantes nos mercados com um poder enorme quer perante os consumidores, e perante os fornecedores de pequena dimensão com quem se relacionam.

Estes podem ser facilmente esmagados sem uma regulação efetiva. O setor da distribuição é disso exemplo, os produtores agrícolas, em geral de pequena dimensão, sofrem uma chantagem permanente das grandes superfícies e devem de ser protegidos pela Lei, para sua sobrevivência.


Intervenção na Assembleia da República, no dia 17 de junho de 2016, no debate sobre o tema "Economia e empresas".

(publicado no esquerda.net a 21/06/2016)